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quinta-feira, 5 de setembro de 2013

O FINAL VAI SER FELIZ

Raquel Rolnik

A resistência dos cinemas de rua em São Paulo

Até 1900, as exibições de filmes em São Paulo eram feitas de forma ambulante, em barracões improvisados onde era instalado o cinematógrafo. Foi somente a partir desta época que as sessões passaram a ocupar locais fixos, especialmente em salões, cafés e teatros, como o cine-teatro Colombo, no Brás. As primeiras salas de cinema propriamente ditas da cidade foram inauguradas apenas em 1907, sendo a primeira delas o Cine Eldorado e, logo em seguida, o Bijou, na São João. Nos anos 1940, o número de salas dobrou em relação à década anterior, e nos anos 1950, as salas triplicaram: 154 novas salas foram inauguradas. Estas informações estão disponíveis no artigo “A relação da sala de cinema com o espaço urbano em São Paulo: do provinciano ao cosmopolita”, da urbanista Paula Santoro.
Hoje em São Paulo temos apenas cinco cinemas de rua em funcionamento: o Espaço Itaú, com cinco salas; o Reserva Cultural, com quatro; o Marabá, com cinco; o Cine Sabesp e o Cine Sesc. Lendo o artigo da Paula, lembrei-me imediatamente da falta que faz o Belas Artes, fechado em 2011. Na época, o proprietário, decidiu vender o prédio, aproveitando-se da altíssima valorização imobiliária na região. De lá para cá, formou-se um movimento pela reabertura do cinema que, como forma de pressão e resistência, conseguiu levar o caso aos órgãos de defesa do patrimônio cultural. No final de 2012, o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat) decidiu tombar a fachada do prédio. Isso dificultou os planos do proprietário, já que a possibilidade de fazer alterações físicas no imóvel tornou-se bastante limitada.
Recentemente, porém, soube que na última reunião do Condephaat, realizada no dia 12 de agosto, houve uma tentativa de “destombamento” do Belas Artes, mas não encontrei notícias mais precisas sobre o assunto. Enquanto isso, o Movimento pelo Cine Belas Artes (MBA) vem discutindo, no processo de revisão do plano diretor da cidade, a proposta de criação de uma Zona Especial de Preservação Cultural (Zepec), que incluiria a região do Belas Artes e seu entorno, facilitando uma solução que viabilizasse a proteção do prédio e seu funcionamento como cinema.
O drama do Belas Artes não é uma questão isolada. Não apenas cinemas, mas também teatros de rua viveram um esvaziamento, especialmente, nos anos 1990, época em que se iniciou oboom da construção de shopping centers na cidade. O argumento fundamental, “real e imaginário”, dessa mudança era a questão da segurança, afinal, em tese, os shoppings eram mais seguros e confortáveis que as ruas, relegadas a mero espaço de passagem de veículos e pessoas, não exercendo a função de espaços de permanência e convivência. Tenho certeza, porém, que o momento que vivemos hoje na cidade é outro. As recentes manifestações, e mesmo inúmeras mobilizações e intervenções anteriores que já reivindicavam a valorização dos espaços públicos, parecem mostrar que existe um desejo de mudança na lógica de construção de nossa cidade.